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VISÃO ABRANGENTE DA CONSCIÊNCIA DE SI

Este texto foi retirado do livro "O Novo Despertar da Deusa", Organização de Shirley Nicholson, Ed. Rocco.

 

UMA VISÃO MAIS ABRANGENTE DO PROBLEMA HOMEM-MULHER

Roberto Assagioli em entrevista à Claude Servan-Schereiber

"Pois os espíritos, quando lhes apetece, podem ter qualquer sexo, ou ambos; tão tênue e efêmera é a sua essência".

                             John Milton, Paraíso Perdido.

A primeira vez que vi Roberto Assagioli, foi há cerca de dois anos, em sua casa em Florença, a velha casa onde passou grande parte de sua vida. Ele nos levou a seu escritório, tão entulhado de livros e papéis, que tivemos de tirar uma pilha do lugar para que eu e meu marido tivéssemos onde sentar.

Por um longo momento, ficamos nos olhando uns para os outros. Assagioli sorria, os olhos espantosamente vitais num rosto vincado pele idade avançada, movendo-se sobre nós, de um para o outro. Estava nos submetendo a um exame? Pelo contrário. Estava permitindo que o descobríssemos à vontade para estabelecer uma ligação com ele, sem que sequer percebêssemos que isso acontecia. Era um clima de comunicação em que as palavras acham seu caminho depois, enquanto algo como uma corrente se desenvolvia entre nós. Seu rosto brilhava com uma alegria interior radiante e extraordinária, como nunca encontrei num octogenário, e raramente em homens muito mais novos. Esta mensagem de alegria, percebida imediatamente, comunicada imediatamente, é a lembrança mais nítida que guardo dos numerosos encontros que depois vim a ter com ele.

"Tudo é possível e acessível a você alegria, serenidade, eu as ofereço a você como um presente".

Eu não esperava encontrar em Roberto Assagioli o eco da minha própria preocupação numa área particular e específica: a psicologia das mulheres num mundo em que suas regras e suas funções as levam a sofrer primeiro um condicionamento, e, depois, uma opressão que freqüentemente ainda não reconhecem. Aos olhos da feminista que sou, o pai da psicossíntese tem, portanto, um mérito adicional: uma capacidade fantástica de se adaptar a atitudes em mudança, que surge de sua vontade de compreender os outros e de seu amor pela verdade científica, ainda que diferente de suas crenças anteriores. Sobre a questão da mulher ele havia sido bem limitado no passado; e ele sabe disso e o admite com franqueza. Foi influenciado por preconceitos culturais que identificam como "natureza feminina" o que é em grande parte o produto de um sistema social. Mas depois ele se libertou, a este respeito, do peso de sua criação, de seu ambiente, de sua idade. Rapidamente se interessou pela nova pesquisa existencial da natureza da mulher que é o nosso movimento de libertação. Em sua idade, e para um italiano, esta é uma dupla conquista! Especialmente se julgarmos de acordo com suas conclusões.

Não há, e não pode haver, uma psicossíntese geral das mulheres, ou mesmo dos homens. Existe apenas, para cada indivíduo, de cada sexo, uma jornada única e pessoal para a evolução de todas as suas faculdades emocionais, mentais, espirituais. "O ser humano", disse ele, "hoje em dia não é mais definido por nenhum de seus papéis. Acredito na primazia do ser humano não condicionado por seu sexo". Pode haver mensagem mais bonita? Aqui está amplamente o que ele me disse sobre o assunto:

Assagioli:

"Não podemos falar com precisão de mulheres e homens em geral. Cada um de nós é um ser humano antes de ser "homem" ou "mulher". E cada um, homem ou mulher, tem papéis e funções a cumprir, individual, interindividual, e socialmente. Aqui é onde as diferenças começam. Elas são, muito enfaticamente, não diferenças de valor, apenas diferenças de função. O ser humano nunca se define por qualquer desses papéis. As mulheres com seres humanos, podem ou não aceitar papéis femininos tradicionais. Não é necessário que uma mulher aceite o papel de esposa ou de mãe. Ela pode escolher outra vocação. Não é um dever, uma necessidade. É uma escolha livre".

"A mulher, portanto está certa em exigir ser tratada como um ser humano e não como uma "simples mulher", como apenas uma mulher. Ela está certa em se recusar a ser identificada com certa imagem de mulher. Ela é um ser vivo, com toda a dignidade e o potencial de um ser humano completo.Todas as atitudes que limitam as possibilidades da mulher estão erradas. As mulheres têm o direito de  exigir respeito e igualdade com os homens. E o mesmo, é claro, vale para os homens."

"Cada um de nós pode igualmente escolher desempenhar diferentes papéis. Por exemplo, uma mulher pode decidir desempenhar o papel de esposa ou de mãe, ou ambos. Ela pode realizar uma atividade criativa, social ou de negócios. Pode escolher um papel, ou pode alternar vários deles, talvez por vários dias talvez por períodos mais longos. Esta é a livre escolha de um ser humano, Eu acredito na primazia do ser humano não condicionado por seu sexo".

"As diferenças entre o homem e a mulher se encontram claramente refletidas em nosso ambiente - na família e na sociedade -, e é aqui que devemos lutar para eliminar sua cristalização injusta e daninha em preconceitos e estereótipos rígidos."

"Mas é importante perceber que essas diferenças existem também dentro de nossa psique, nas profundezas de nosso inconsciente e, da mesma forma, no inconsciente coletivo da humanidade, em que aparecem através de alguns dos mais poderosos arquétipos. Existem, pois, os princípios masculino e feminino universais, que se manifestam de maneira bem diferente através de indivíduos diferentes. Em outras palavras, como ambos os princípios existem no universo, pessoas diferentes os experimentam e os descrevem de diferentes maneiras... e da mesma forma com a beleza, a verdade, a harmonia, a bondade, a justiça ou qualquer outro dos princípios universais."

"A questão não é tentar definir o que são esses princípios, mas sim distinguir, em nossa consciência e nossas relações com os outros, 'masculino' e 'feminino' de 'homem' e 'mulher'. Precisamos reconhecer que ambos os princípios, o masculino e o feminino, existem por seus próprios direitos e estão presentes – embora em formas únicas e proporções diferentes – em todo o homem e toda mulher".

"Dentro de cada ser humano existe um percentual de masculinidade psicológica e feminilidade psicológica, completamente independentes do sexo do indivíduo. Cada pessoa é uma combinação única dessas energias. Quando olhamos para uma mulher no todo, descobrimos que ela está mais ligada ao princípio feminino, tem maior acesso a ele e uma porcentagem mais alta dele em sua estrutura psicológica. E, de forma parecida, os homens são mais ligados ao princípio masculino. Claro que isto é uma generalização. As pessoas são únicas. Alguns homens são psicologicamente mais femininos do que muitas mulheres, por exemplo".

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"Existe, portanto, uma diferença entre sexo físico e características psicológicas. Ao longo dos anos, conheci muitas pessoas que temiam – ou até acreditavam – ser homossexuais simplesmente porque não reconheciam esta distinção".

"Somente aceitando os princípios masculino e feminino, colocando-os juntos e harmonizando-os dentro de nós seremos capazes de transcender o condicionamento de nossos papéis e expressar todo o alcance de nosso potencial latente".

"Assim como isto é verdade para o indivíduo, o é para a sociedade. Do ponto de vista social, existe na sociedade atual uma grande necessidade de expressão do princípio feminino. A sociedade precisa das mulheres para contribuir com os valores mais altos de sua feminilidade – amor altruísta, compaixão, o sentido da e o respeito pela vida -, com os quais elas estão geralmente mais familiarizadas e que podem frequentemente expressar com maior facilidade do que os homens. É desejável para as mulheres, portanto, envolver-se na vida social e política. Se elas escolherem assim, poderão fazer isso enquanto continuam a desempenhar papéis femininos tradicionais em atividades como serviço social, renunciando aos papéis tradicionais da família. Elas tem todo o direito de fazer isso. A sociedade deve respeitar e apreciar sua contribuição valiosa".

"O fato de uma mulher dedicar a maior parte seu tempo a certos papéis não deve impedi-la de se considerar igual ao homem. Não é uma questão de superioridade e inferioridade. Características psicológicas masculinas e femininas, muito embora dessemelhantes, são do mesmo valor. Esta é uma afirmação de fato".

"As mulheres estão certas em protestar e se levantar contra as atitudes preconceituosas que há muito tempo vigoram na sociedade. Mas no protesto pode-se perder a perspectiva. Pode-se ser destrutivo, e não construtivo. Conflitos e exageros podem ser entendidos psicológica e historicamente. O ideal é que permanecessem dentro de limites tão construtivos quanto justos".

"Por exemplo, algumas mulheres vão até o extremo oposto dos estereótipos sociais atuais. Em vez de equilibrarem e integrarem suas energias femininas com as suas energias masculinas, elas podem virtualmente negar o feminino em si mesmas. Uma mulher pode rejeitar papéis femininos tradicionais para provar aos homens que pode desempenhar papéis masculinos. Aqui existe o perigo da masculinização da mulher. Ironicamente, esta atitude pode vir de uma avaliação inconsciente do princípio e do papel masculinos como inerentemente superiores aos femininos. Mas não existe esta superioridade inerente. O que é necessário é honrar e valorizar o princípio feminino e os caminhos pelos quais essa energia pode ser expressa, tanto por homens como por mulheres. Os papéis masculinos não são melhores nem piores que os femininos. Ambos são necessários e de igual valor".

"Uma questão controvertida: o fato de as mulheres frequentemente terem certas funções melhor desenvolvidas e os homens outras seria um produto da natureza, da educação ou de pressão social? Em minha opinião, todos os três fatores estão presentes, em proporções diferentes, em cada indivíduo".

"Embora este seja um importante problema social, felizmente, do ponto de vista do indivíduo, ele pode ser contornado. Ele ou ela só precisam considerar como ele ou ela estão neste momento e como podem melhorar". 

"Por exemplo, se uma mulher teve menos oportunidades ou incentivos para expressar suas idéias, seus pensamentos, não me parece necessário gastar muito tempo e energia para tentar entender o porquê, quem é responsável por isso, e assim por diante. Muito simplesmente, se esta função for insuficientemente desenvolvida, ela pode desenvolvê-la. E o mesmo se aplica a um homem que não tenha desenvolvido seus sentimentos e sua intuição. (Nem preciso dizer que existem homens que precisam desenvolver seu intelecto e mulheres que precisam entrar em contato com sua intuição.) A questão é reconhecer as qualidades fortes e as deficiências em cada pessoa – que não são 'defeitos', mas deficiências qualitativas relativas – e conduzi-las a um estado de harmonia e equilíbrio. Isto é o que eu chamo de abordagem psicológica e espiritualmente prática".

"Vamos falar agora do casal. Um casal alicerçado numa base de igualdade fundamental, respeito, apreciação recíproca como seres humanos pode trabalhar junto a psicossíntese de sua condição de casal. Cada um pode trabalhar em sua própria psicossíntese e pode também colaborar na do outro, ajudando-o a reforçar sua funções menos desenvolvidas. Então, quando tiverem feito isso até determinado ponto, poderão verdadeiramente agir como casal, combinando e complementando suas e funções em todas as situações: no casamento, em seus papéis como pais e em suas atividades sociais".

"Para cada função a ser desenvolvida é necessário um treinamento... frequentemente incluindo exercícios específicos. O processo é análogo a um treinamento de musculatura: se alguém quiser praticar um determinado esporte, acha uma pessoa que seja competente, treina como ela e depois continua a treinar sozinho. Se um homem reconhece que seus lados emocional e imaginativo foram negligenciados, pode cultivá-los. Se uma mulher descobre que sua mente não é tão ativa quanto gostaria que fosse, pode treiná-la. A maneira de 'cultivar o próprio jardim' é plantando flores diferentes, Uma mulher e um homem podem fazê-lo sozinhos, mas é mais eficaz, mais fácil e mais agradável fazerem isso juntos, a dois".

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"A situação é diferente para cada casal. Cada ser humano é único. Portanto, único multiplicado por único da único ao quadrado; este é um princípio fundamental da psicossíntese. Cada caso é único, cada situação é única. Cada casal é único. Precisamos nos concentrar mais no problema existencial único de certa situação do que em generalidades e depois escolher técnicas que sejam mais adequadas para resolver os problemas daquele caso em particular. Isso elimina os problemas fictícios e falsos. Essa pode ser chamada de fase psicanalítica: a descoberta dos obstáculos ao trabalho construtivo. E os obstáculos são em maior parte aqueles sobre os quais falamos antes: atitudes errôneas dos homens e das mulheres. Acredito, pois, na igualdade de valores e na diferenciação de funções até certo ponto. Colaboração, integração, sobre uma base de igualdade".

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"Numa grande variedade de situações, sempre há no ser humano a possibilidade latente de fazer alguma coisa dentro de limites razoáveis, escolher livremente, despir-se de pressões, preconceitos, obstáculos sociais, para atingir seus objetivos mais altos".

"Estamos agora num período de crise e mudanças profundas. Acredito que a mulher está evoluindo mais rápido que o homem. Para ele, a tarefa é descobrir o verdadeiro ser humano por baixo das limitações masculinas – não ser apenas um 'homem masculino', mas ser um ser humano que desempenha papéis masculinos...e,se assim escolher, femininos. Sabemos que historicamente existiram civilizações matriarcais e civilizações patriarcais; o ideal seria uma nova civilização sintética, que não fosse nem patriarcal, nem matriarcal, mas psicossintética, ou seja, uma civilização onde as melhores e mais altas qualidades de cada uma se manifestem".

"Isto seria uma coisa nova. Em todas as civilizações e culturas históricas, houve sempre uma preponderância de um ou outro elemento. Mas nessa nova civilização e na nova cultura global emergente, pela primeira vez a humanidade estaria suficientemente evoluída para construir um padrão planetário, global, incorporando o melhor de todos os homens e de todas as mulheres. Eu acho que essa psicossíntese planetária, a psicossíntese da humanidade é possível e necessária. Cada problema particular terá, então, sua referência no todo maior, e os conflitos poderão ser substituídos pela integração e cooperação harmoniosas. Tudo isso está ao nosso alcance, pois não é apenas muito bonito, é muito humano".

Roberto Assagioli, psiquiatra italiano, criador da Psicossíntese, técnica psicológica que visa alcançar o ser humano no seu aspecto mais desenvolvido, o seu "Self Superior".

Saiba mais no sites:  

www.psicossintese.org.br

http://sites.google.com/site/psicossintese

   

      

          

     

 

 

 

 

 

 

 

                      

 

 



08/12/2009

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